Foi o primeiro mês de janeiro das nossas vidas vivido em pandemia, mas releva-se a vontade de os portugueses viverem em democracia. As eleições presidenciais levaram as pessoas para a rua. Vontade de reagir com atitude a este atropelo que nos apareceu pela frente. Estas eleições foram na semana passada, mas parece que foram à mais tempo. A pandemia acelera o tempo e atrasa as nossas vidas.
Pela primeira vez na história da democracia portuguesa houve um candidato neofascista. Candidato que gritou que nem um castrado por vitória — euforia ridícula quando não cumpriu um único ensejo prometido —, numa eleição em que teve pouco mais de 11%. O Presidente eleito — com eleição largamente triunfante — arrancou logo na noite eleitoral com um discurso de Estado rigoroso e preocupado com o presente e o futuro do país. Todos os restantes candidatos alinharam em postura de reconhecimento dos resultados com a dignidade que sempre mostraram. Facto: mais de 88% dos eleitores votaram pela democracia. Diz-se: temos que perceber a razão porque votou tanta gente num neofascista. Não penso assim. Temos é que nos preocupar com quem votou na democracia representativa tal como ela está instalada. Claro que não são eleitores completamente de acordo com o estado do Estado — quem o é? — , mas mostraram o que querem: um regime que funcione democraticamente sem demagogos sem escrúpulos a vomitar ódio.
No futuro, parte dos eleitores vão exercer votações nos seus partidos de sempre — aquilo foi uma graça sem graça nenhuma. O candidato neofascista veio directamente do PSD, em invenção de Pedro Passos Coelho — e regressarão às suas opções apreciadoras da democracia. O facto de existirem quase quinhentos mil eleitores no candidato neofascista pode incomodar. Portugal tem perto de dez milhões e duzentos mil cidadãos. Ressabiados sem instrução que adoram experiências irresponsáveis sempre haverá. Mas não é de quase meio milhão de fascistas que falamos. Há ali desiludidos de toda a espécie que viram num populista demagogo uma vontade de expressar raiva. Foi um vómito ocasional de quem está maldisposto com tudo. Aquilo passa. Digo eu, e espero não estar enganado.