terça-feira, 31 de janeiro de 2023

De corpo inteiro



Quem não toca faz retratos. Quem pode, é claro. Quem pode e quer. Fotografar um concerto de Jazz pode ser um acto de amor. Intenso, arrebatador. Fotografar é sempre uma actividade exigente fisicamente. Aqui o corpo entra no território do espectáculo. A emoção, apesar de paralela aos sons, penetra na pele e percorre o corpo. Exemplo de topo: a relação de Keith Jarrett com o piano é de uma intensidade contagiante. Sentimos quase fisicamente aquele acto de amor. Fotografar os seus esgares e fazer sentir visualmente os sons corporais são um desafio para quem o regista em imagens, digo eu. Anabela Carreira percebe a intimidade dos relacionamentos dos artistas com os seus desempenhos em palco. Os registos que aqui nos apresenta, de concertos Jazz feitos na cidade, são testemunhos de uma acção de reconhecimento de uma actividade que aprecia, evidência, mas que entra mesmo de corpo inteiro nela. Até parece que está ali a tocar com os músicos. E está. Não se está mesmo a ver?

segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

A beleza de mudar governos e políticas


Nunca fiz isto na vida, nunca pensei fazê-lo, e nem voltarei a pôr essa hipótese. Atrevo-me a fazer uma sugestão ao primeiro-ministro do meu país. 

O que está a acontecer a um governo eleito com maioria absoluta é excessivamente mau. Claro que quando aparece um caso — seja em que actividade for —, surgem logo os imensos casinhos, mas desta vez a coisa está a ficar exagerada. E ainda bem que assim é. Temos o direito de saber quem é que nos governa. Um secretário de Estado é um político. Quando é convidado alguém para exercer um cargo com responsabilidade política deve estar sempre presente a confiança política. Um político não é um funcionário público. Exerce funções públicas, mas não tem de responder a exigências do funcionalismo. As 36 perguntas aos possíveis ocupantes dos cargos não leva a nada. Alguém vai responder afirmativamente que se portou mal? Quem está para aí virado tem um problema que não é menor: adora os carros de cilindrada alta com motorista e mordomias, e não percebe que esses lugares não dão para aquecer o rabo no assento. Os mal formados que percebem que assim é tratam de resolver a sua vidinha. Chama-se a isso corrupção. O responsável pelos convites aos seus colaboradores é o ministro. Pedro Nuno Santos sabe disso, por isso se demitiu. É o responsável político que deve assumir os erros dos seus próximos. Ele é o responsável por tudo o que se passa por cima dos confortáveis tapetes e poltronas dos ministérios. Claro que de um governo de esquerda a coisa pia mais fino. Não faz sentido tanta palermice parola. Tanto deslumbramento. Sim, o deslumbramento com o poder é para os parolos sem mundo e sem trambelho. O exercício da política traz responsabilidade; não deslumbramento.

A minha proposta é esta, senhor primeiro-ministro: Remodelação total. Escolha gente que corresponda ao que quer fazer. Perceba que os seus ministros escolhem secretários de Estado e sub-secretários de Estado que não o envergonhem nem envergonhem a política. Assuma isto. Mudar é preciso. Às vezes é preciso mudar muito. Não dê argumentos aos escroques de extrema-direita que florescem como erva daninha. A maioria absoluta que permitiu ao Partido Socialista formar governo aconteceu porque os fascistas estão a crescer. É assustador. A malta reagiu assim. Chama-se voto útil. É a utilidade da vontade de combater os fascistas. Com eleições agora o crescimento da extrema-direita estaria muito perto do susto. Viu o grunho aos berros num palco em Santarém? Viu a peça de Tiago Rodrigues "Catarina e a beleza de matar fascistas"? Eu assustei-me. E revoltei-me. Mas fiquei com mais força para combater esses energúmenos que já dizem o até há pouco impensável contra a democracia e os direitos das pessoas. É por isso que me atrevo a vir para aqui dizer estas coisas. Sei que provocarei um esgar de riso em muita gente e em si também, se me lesse. Mas não pude deixar de o fazer. Estou preocupado como cidadão. É o meu combate. O fascismo não pode passar. E o fascismo não está só no partido fascista. Lembra-se de onde saiu o energúmeno do Chega? Veja lá isso. Coragem.

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A vida, sempre, com dignidade


O Tribunal volta a estar mal. Foram sete dos treze juízes a votar contra uma lei justa e de protecção de uma vida digna. Os deputados decentes terão de voltar a ajustar o projecto à opinião dos juízes do Tribunal Constitucional. De novo. E de vez. O pulha do Chega já veio para as televisões (anda lá sempre) para vomitar as baboseiras do costume. As televisões adoram-no. A decência despreza-o. A decência prefere uma vida decente.

Design de equipamento


Discute-se a verba que se vai gastar nos altares do Papa, mas ninguém fala nos problemas oftalmológicos. Aquilo faz mal à vista. É de um mau-gosto de bradar aos céus. Eu até percebia que se gastassem trinta milhões de euros para que aquele horror não fosse construído. Seria um benefício estético, e um bem para os olhos. E para o cérebro. O custo do projecto tem contornos milionários, mas a sua execução é, esteticamente, de uma pobreza franciscana.

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domingo, 29 de janeiro de 2023

LUÍS MOITA

Morreu Luís Moita. Intelectual respeitado, cidadão solidário e activista esclarecido. Foi figura grada no combate ao fascismo e à ignorância populista. Um grande senhor que agora nos deixa. Muito obrigado, Luís Moita.

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A fúria das ratazanas

Parece que fascistas de toda a Europa se encontraram este fim-de-semana em Portugal. O fascista português, no fecho do encontro dos fascistas portugueses, desatou aos berros, como é costume, vomitando as alarves baboseiras do costume. O ódio e a infâmia dominaram o aquele estrado. A postura é a dos fascistas de sempre, mas com mais tecnologia. As televisões, como é costume, deram voz e imagem a este encontro dos miseráveis fascistas. Tudo isto é miserável.

Nesta casa me desenho

São pinturas desenhadas, ou desenhos pintados? São projectos de imaginação de uma certa arquitectura pessoal. O que será isto? Quem o saberá? Será que o perceberemos se visitarmos a exposição que abre no próximo sábado na Casa da Cultura, em Setúbal? Provavelmente sim. Ou pelo menos ficamos com uma ideia, que será a nossa, pessoal, sobre o que é pintar o que observamos no nosso dia-a-dia. Até lá.

domingo, 22 de janeiro de 2023


As palavras armazenam-se como torrões maduros
São flexíveis à memória são marinheiros em terra

Acontece dizer: levantem-se e caminhem

Mas quem somos e que hábito envergamos?

As palavras entontecem

Quando dispersas levantam rumos vários

                                                 José Afonso






Usamos as palavras sem nos apercebermos da estética que encorpam. 

Tanto tipo de letra por perceber. Tanta palavra por alinhar nas carreirinhas do pensamento diário. 

São as letras que nos acompanham na percepção dos dias. Nos momentos bons e nos momentos difíceis.

Há sinaléticas que definem profissões. Há letreiros que nos indicam afazeres ou simplesmente um caminho.

Mesmo o que não tem palavras terá de ser definido por palavras.

Este palavrar dita-nos prazeres e mágoas. Assiste-nos e dispensa-nos. Somos vida. Somos palavras.


Vamos criar alfabetos imperceptíveis. Para que se tem de perceber tudo?

Vamos tentar perceber, sim, a razão de termos escrita. 

Vamos olhar para o que se escreve com olhos de olhar e ver.


Não existem influências estéticas neste projecto. Ou existem, pronto. José Afonso tinha exigências visuais estéticas. Convocou designers e fotógrafos para as capas dos seus discos: fotógrafos que sabem ver. Designers que sabem criar imagens. O poema de José Afonso que encima este palavrar sugere a multiplicidade de rumos para as palavras. As palavras definem rumos. São os caminhos livres de obstáculos. Sem pedras.


As palavras entontecem 

Quando dispersas levantam rumos vários


A caligrafias imperceptíveis vamos associar motivos de denúncia. Denunciar a violência. As agressões aos desprotegidos. A agressão neoliberal que se atreve a convencer os incautos de que é civilizada. O fascismo que se aproxima dos poderes institucionais. 


São os elementos tipográficos que nos interessam neste projecto. Camadas de palavreado em protesto ou simples reparo. É de intervenção, esta exposição. 


Estética/ética. Sem insistências moralistas. Com assertividade política.

Política é fundamental. 

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sábado, 21 de janeiro de 2023

Tribunal inconstitucional

O tribunal do senhor Caupers declarou inconstitucional a defesa dos animais. Caupers é um conhecido sexista. Um reaccionário empedernido. Em 20 de fevereiro de 2021 falei aqui do erro de termos este senhor à frente do Tribunal Constitucional, que, com a sua entrada para a liderança se tornou pouco constitucional. Tem lá seguidores, pelos vistos. Os animais não merecem protecção. Quem o decreta é o serôdio tribunal dos homens. Quem nos livra destes justiceiros retrógrados e pouco civilizados? E quem alinha com a protecção dos animais? Nós, é claro. Os senhores e senhoras do Tribunal Constitucional é que não merecem protecção nem consideração. Vão dar banho ao cão.

Camisa lavada com nódoas


Há um novo partido que quer acabar com os apoios sociais. Bem, não é um: são dois. Um é mesmo fascista e é liderado por um troglodita manhoso que está sempre aos berros. O outro é de gente que se refrescou e até parece civilizada. São liberais de pacote. Querem acabar com os pobres e a pobreza  retirando-lhes "Estado". O Estado deve estar arredado de tudo o que cresce. O Estado só deve existir para pôr tudo a toque-de-caixa. No Chile de Pinochet é que foi. A democracia é uma chatice. Quem contesta leva porrada. Quem precisa vá pedir à mão. Quem é pobre... paciência. O mundo é dos espertos. Quem tem unhas é que toca viola. O partido civilidazinho está este fim-de-semana a escolher um novo líder. Um unicórnio, com certeza. Um mandão engravatado e com vontade de acabar com o sistema democrático. O Ghega é fascista? É. Mas estes liberais de pacote são um perigo maior. Há quem lhes dê importância. Há quem os ache politicamente asseados. Não o são. São gente do pior. Não são fascistas? Por enquanto não. Mas se for preciso... 

Enfim, é combatê-los. Sempre.

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PASSAGENS com Manuel António Pina


Conversar com Rita Basílio sobre Manuel António Pina, ontem, na Casa Da Cultura | Setúbal, foi um prazer que se transformou num dos grandes (haverá pequenos?!) momentos Muito Cá de Casa. Sempre que Manuel António Pina aqui regressa dá-se uma visita pela cultura portuguesa. Já assim foi quando Inês Fonseca Santos aqui trouxe a Casa do Poeta. Agora foi a vez de passarmos em revista os lugares, os amigos, as atitudes e a participação cidadã. Manuel António Pina foi um grande cidadão.
Vai aqui regressar, com certeza, porque revisitá-lo é sempre um prazer.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

Muito cá de casa


É hoje à noite que vamos evocar e falar pelos cotovelos de Manuel António Pina. É sempre bom e divertido falar deste homem admirável. Apareçam na sala José Afonso da Casa Da Cultura | Setúbal. Até já.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

Dia Internacional do Riso

Escolhi bem o dia. Foi ao acaso, claro. Acertei. Vou lá hoje. Parece que está tudo esgotado até ao último dia. Vou ver estes meus amigos em grande reboliço. Já conheço a dupla a pisar as tábuas do palco, mas acho que me vou surpreender. Estes dois são sempre uma surpresa.

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terça-feira, 17 de janeiro de 2023

Muito cá de casa


É o primeiro encontro Muito Cá de Casa do ano. E começamos com o melhor do que nos deixou uma das grandes figuras da cultura feita em Portugal: Manuel António Pina.

Rita Basílio concebeu e coordenou esta obra notável. Manuel António Pina, o poeta o homem e as suas atitudes e vontades impressas em livro de grande formato e ambição. Vale a pena percebermos quem foi o Homem, e vale a pena estarmos na Casa Da Cultura | Setúbal, já na próxima sexta-feira, dia 20 de janeiro, para falarmos sobre tudo isto. Convidados. Bem vindos.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Gina Lollobrigida

Lembro-me de imagens avulsamente reveladas. Lembro-me bem de "Pão, amor e fantasia", de Comencini, onde contracenou com Vitorio De Sica. Lembro-me de ter sido considerada a "mais bela mulher do mundo". Percebi que, muito recentemente, aos 95 anos foi candidata por uma coligação de esquerda às eleições italianas. Calculo que deverá ter ficado bastante triste por ter assistido à eleição de uma neo-fascista.

Concluo que Gina Lollobrigida foi uma grande senhora. Vou perceber melhor o seu trabalho como actriz. Esse trabalho merece ser bem conhecido. Ela merece o nosso reconhecimento.


domingo, 15 de janeiro de 2023

Natureza Humana

Naturezas desumanas, ou as idiotices macabras dos idiotas. O Brasil esteve entregue a um bandido. É difícil para um idiota convencido de que é o máximo convencer-se de que é o mínimo. Um veneno perigoso.

Cartoon: Cristina Sampaio, no Público.

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sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

Receituário

Imagem e música em convívio distinto. Os grandes fins de tarde sucedem-se em Lisboa, antes das maravilhosas noites.

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quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Receituário

CARTOONS DE LUÍS AFONSO | Dia feliz, mas intenso. No mesmo dia abrem duas exposições de amigos que muito prezo e admiro. O Pedro Chorão, como referi em post anterior, vai estar a partir de hoje na Galeria Monumental, e o Luís Afonso vai mostrar os cartoon/2022 na Casa da Imprensa, também nesta quinta-feira, dia 12 de janeiro. Vai ser uma correria, mas vai valer a pena.

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quarta-feira, 11 de janeiro de 2023

Receituário



E A PINTURA CONTINUA | Pedro Chorão não pára. Amanhã, quinta-feira, abre mais uma exposição sua na fantástica galeria Monumental. São trabalhos recentes, banhados dos seus azuis tão pessoais e únicos, mas sempre polvilhados de surpresa. Claro que esta é uma exposição a não perder "nem que chovam picaretas", como cantou José Afonso. Lá estarei, para dar um abraço ao Pedro e para me deslumbrar. É o que acontece sempre que me perco numa exposição de Pedro Chorão.

Paisagem Continuada
Pedro Chorão
Inauguração quinta-feira, 12 de Janeiro, 18h-21h
Galeria Monumental

terça-feira, 10 de janeiro de 2023

Les aventures de Hergé




O Tintin nasceu a 10 de janeiro de 1929. Faz hoje 94 aninhos. Mas a energia parece renovada a cada geração. E não parece ter parança. Muito obrigado, Hergé.

domingo, 8 de janeiro de 2023

Os fascistas andam aí

Foi nos EUA, e foi agora no Brasil. Corremos o risco de termos o vandalismo como moda. Nas redes sociais portuguesas já tropeçamos em apoiantes do partido fascista de Ventura em louvor da atitude do "grande povo brasileiro" que invade o Planalto, louvando os vândalos protagonistas desta acção bolsonarista. Se isto se torna moda, e se se tivernos em conta as declarações laudatórias destas acções pelos fascistas do Chega, bem podemos pôr as barbas de molho se o manhoso do PSD chega a primeiro-ministro. Resultados eleitorais não se podem prever. Somos democratas, respeitamos resultados. Mas podemos prever o que pensam os fascistas portugueses activos nas redes sociais sobre isto, e isso não nos pode descansar.

Preocupante


BOLSONARISTAS INVADEM E DESTROEM INSTALAÇÕES DO PALÁCIO DO PLANALTO E SUPREMO TRIBUNAL | O troglodita americano fez escola. O seu discípulo brasileiro também não reconheceu resultados nem participou na tomada de posse do novo Presidente. Os cretinos de extrema-direita mostram a sua verdadeira face. Democracia não é flor do seu jardim. A violência é a sua linguagem. É gente má. O que está a acontecer é inadmissível. Preocupante.

Contra o fanatismo religioso

No dia 7 de janeiro de 2015 foram assassinadas dezassete pessoas por um fanático intolerante. Um criminoso anulou vidas de gente que era gente. Gente que expressava opiniões marcantes. Activistas de causas que querem fazer avançar a humanidade. Foi no Charlie Hebdo. Foram assassinadas pessoas com ideias e com vontade de as partilhar. A intolerância não pode continuar a matar como se todos fossemos infiéis a abater. A intolerância não pode vingar.

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sábado, 7 de janeiro de 2023

Sustentar


É a exposição de janeiro na
Casa Da Cultura | Setúbal. Os problemas ambientais tratados esteticamente com rigor e denuncia. Faz falta avisar a malta. Faz falta não continuar a atentar contra o ambiente já tão mal 
tratado.

Os novos fascistas


A criatura é chamada a toda a hora para comentar isto e aquilo. 
Os jornais televisivos divulgam as atoardas com a justificação de que estas inenarráveis criaturas formam a terceira força política. Normaliza-se assim o partido fascista. Os novos fascistas sabem que para se fazerem ouvir basta fazer alarido. A Assembleia da República passou a ser habitada por uma gente que provoca ruído por dá cá aquela palha. O labrego que dirige o partido fascista está sempre de goela aberta em busca de ser ouvido pelos labregos que nele votaram. Ouvi à pouco a criatura, num comício, em grande espalhafato, aos berros, anunciando que vai levar à AR uma proposta altamente sensata: os membros do governo passam a ser escrutinamos um por um pela oposição no parlamento. Ou seja: a oposição passa a formar governo. A balbúrdia lamentável que o governo permitiu que se instalasse com as recentes nomeações leva estes cretinos a comportamentos hilariantes. Esta gente não sabe como funciona a política nem a sociedade. Só sabem dizer disparates aos gritos. A imprensa dá-lhes cobertura como se fossem gente respeitável. Não são. Os fascistas não se respeitam. Combatem-se.



 Cão

Cão passageiro, cão estrito,
cão rasteiro cor de luva amarela,
apara-lápis, fraldiqueiro,
cão liquefeito, cão estafado,
cão de gravata pendente,
cão de orelhas engomadas,
de remexido rabo ausente,
cão ululante, cão coruscante,
cão magro, tétrico, maldito,
a desfazer-se num ganido,
a refazer-se num latido,
cão disparado: cão aqui,
cão além, e sempre cão.
Cão marrado, preso a um fio de cheiro,
cão a esburgar o osso
essencial do dia a dia,
cão estouvado de alegria,
cão formal da poesia,
cão-soneto de ão-ão bem martelado,
cão moído de pancada
e condoído do dono,
cão: esfera do sono,
cão de pura invenção, cão pré-fabricado,
cão-espelho, cão-cinzeiro, cão-botija,
cão de olhos que afligem,
cão-problema…
Sai depressa, ó cão, deste poema!
Poema de ALEXANDRE O'NEILL
O cão do retrato é o Tom, Major Tom. Bom fim-de-semana.

Receituário


É uma pena não se ler o que vale a pena. Ler devagar, para se sentir o que se lê. Até já.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Receituário


COM AS MINHAS TAMANQUINHAS | É o trabalho mais directamente político de José Afonso. Poderia estar situado no tempo, mas isso não existe quando se fala de José Afonso. A genialidade do autor puxa para os dias de hoje uma memória que se torna História. Também se tornou história —pequena história — a decisão de um jornalista considerar este o pior álbum do ano em que foi lançado. Do jornalista — que até partiu o disco em emissão radiofónica — já ninguém se lembra. Nem do jornalista nem dos outros discos lançados nesse ano. Alguém quer saber do que fez Marco Paulo, por exemplo —  que fez "carreira" com um par de canções — naquele ano? Claro que os Tonys Carreiras, os Toys, os Emanueis e outros cruéis dizimadores das atitudes sonoras e literárias não andavam ainda pelo território, ou ninguém lhes dava importância, mas é claro que para o miserável jornalista de que ninguém se lembra, toda a trampa sonora produzida era audível ao invés deste "Com as minhas tamanquinhas". Este é de facto o trabalho de maior intervenção política de José Afonso. Foi aqui denunciado um fotógrafo sem escrúpulos que usou uma mulher em situação vulnerável para satisfazer os seus intentos mediáticos. Uma crónica de um grande Jornalista — Rogério Rodrigues — despertou José Afonso para a cena. Resultou da leitura da crónica a belíssima canção "Teresa Torga", que se tornou um hino/apelo à dignidade do ser humano. Mas também a denúncia de figuras e figurões da cena política e social de então foi marcante neste trabalho. 

A reedição deste disco foi apresentada em finais de novembro último na Casa da Cultura, Setúbal, local onde outrora funcionou o Círculo Cultural, colectividade antifascista fundada entre outros por José Afonso. Durante a apresentação esteve patente uma exposição do autor da capa do disco: o meu saudoso e querido amigo João de Azevedo. 

O LP em vinil não esteve pronto a tempo de ser apresentado aí. Contentámo-nos-nos com o cd e com a sua audição nas plataformas musicais. Agora já está à venda e recomenda-se. Nada aqui é datado, tudo é fresco que nem uma alface. Os traidores, os oportunistas, os pulhas de toda a espécie continuam aí e não se recomendam, tal como sugeria José Afonso neste disco lançado em 1975. É ouvi-lo. Faz bem.

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quarta-feira, 4 de janeiro de 2023

O tamanho de uma obra


O título deste livro de António Lobo Antunes não traduz a ternura e elegância que tem dentro. Ou então diz tudo daquela maneira que o autor tem de dizer as coisas. Sim, é de um livro de Lobo Antunes que falo. Chamou-lhe "O Tamanho do Mundo" e disse lá o que pensa disto tudo. Personagens que definem carácteres, atitudes, acções. É um belíssimo objecto, este livro de António Lobo Antunes. Deve ser consumido até ao fim, apesar de não ser antibiótico. É Literatura. Da boa. Faz bem.
Confesso que ainda não percebi porque razão ainda não recebeu António Lobo Antunes o Nobel. Mas quem sou eu...

terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Design de comunicação

Da série Grandes Capas.  

Um homem só, como merece. Abandonado pelos seus, como acontece aos piores.

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DO BOM E DO MELHOR | Foi uma das minhas escolhas de 2022. O filme vai estar até amanhã no Cinema IDEAL. É ir lá e vê-lo.

CINEMA - Cláudia Varejão realizou "Lobo e Cão". Um hino ao inconformismo. As origens não têm de ditar regras. Somos donos do nosso corpo. O destino não existe. Somos nós que desenhamos o que queremos ser. Grande filme que nos reconcilia com a ideia do cinema feito para pensar, a que já nos habituou Cláudia Varejão.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

Faz falta quem está


Parece que o Presidente do Brasil recebeu a faixa de Presidente Brasil e não precisou do anterior presidente para a receber. Estava por ali gente que resolveu o assunto. Gente normal. Gente odiada pelo anormal que ocupou o palácio do Planalto. Bolsonaro não faz falta absolutamente nenhuma para nada. Esperemos que Lula saiba continuar o caminho de recuperação da normalidade.

O que temos de mais certo é a incerteza

Vamos continuar a olhar para o mundo e vamos continuar a ficar espantados com o que vamos observando. 

Vamos continuar a assistir à invasão do repugnante ditador russo contra todos nós. Vamos continuar a suportar os "mas" que o tentam justificar. Vamos continuar a assistir à normalização da extrema-direita pela imprensa e comentadores de serviço - ou será ao serviço da extrema-direita? Vamos continuar a ser agredidos pelos operadores culturais das maiorias. Mesmo inadvertidamente, vamos continuar a ter de suportar os ruídos inaudíveis dos arautos da estupidez: Emanueis, Toys, Clementes, Rosinhas, MarcosPaulos, Marantes e outros tratantes irão continuar a contaminar de sustos sonoros o ambiente já tão contaminado que nos rodeia. O Ambiente propriamente dito continuará a ser contaminado também. Vamos continuar a discutir a ampliação de aeroportos para abarrotarmos de ainda mais gente os centímetros quadrados ainda disponíveis nas cidades e campos desta terra dependente do tão agraciado turismo. Os operadores de comunicações, as seguradoras, os fornecedores de energia e todos os fornecedores de aparentes bens essenciais vão continuar a tratar-nos como carne para canhão — eles chama-nos consumidores, os simpáticos — , sem respeito pela nossa dignidade e existência como seres humanos. Somos clientes à força de matérias que nos tolhem e agridem. E os governos dos países estão reféns desta gente tão investidora e empreendedora. No meio desta choldra surge a pouca-vergonha dos que acham que sempre foi assim e que temos de ser optimistas. Temos de defender — ou pelo menos não atacar — os nossos "pimbas", porque são nossos. Temos que ampliar aeroportos e fazer mais aviões porque é o progresso. E depois temos os profissionais do optimismo: os adeptos da "psicologia" coach e da auto-ajuda. Nas piores alturas, surgem sempre estes apologistas da desgraça engraçada (para eles). É vê-los a facturar formações de encher carteiras (as suas) em apelos de puxar para cima o que temos de melhor, que provavelmente é a crescente vontade de os mandar à merda.
Salvam-nos a arte, a cultura, a ciência, que não se integram em nada disto. Pelo contrário: fornecem-nos ferramentas para o combate. Os vibrantes sons, as mais inquietas obras visuais, as mais irrequietas letras, os mais desejáveis progressos científicos continuam a esclarecer-nos, a alegrar-nos e a emocionar-nos com surpresa, com originalidade.
É disso que precisamos para continuarmos o combate contra a insistente estupidez e subordinação. Bom futuro para todos, apesar de tudo isto.