segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

O que temos de mais certo é a incerteza

Vamos continuar a olhar para o mundo e vamos continuar a ficar espantados com o que vamos observando. 

Vamos continuar a assistir à invasão do repugnante ditador russo contra todos nós. Vamos continuar a suportar os "mas" que o tentam justificar. Vamos continuar a assistir à normalização da extrema-direita pela imprensa e comentadores de serviço - ou será ao serviço da extrema-direita? Vamos continuar a ser agredidos pelos operadores culturais das maiorias. Mesmo inadvertidamente, vamos continuar a ter de suportar os ruídos inaudíveis dos arautos da estupidez: Emanueis, Toys, Clementes, Rosinhas, MarcosPaulos, Marantes e outros tratantes irão continuar a contaminar de sustos sonoros o ambiente já tão contaminado que nos rodeia. O Ambiente propriamente dito continuará a ser contaminado também. Vamos continuar a discutir a ampliação de aeroportos para abarrotarmos de ainda mais gente os centímetros quadrados ainda disponíveis nas cidades e campos desta terra dependente do tão agraciado turismo. Os operadores de comunicações, as seguradoras, os fornecedores de energia e todos os fornecedores de aparentes bens essenciais vão continuar a tratar-nos como carne para canhão — eles chama-nos consumidores, os simpáticos — , sem respeito pela nossa dignidade e existência como seres humanos. Somos clientes à força de matérias que nos tolhem e agridem. E os governos dos países estão reféns desta gente tão investidora e empreendedora. No meio desta choldra surge a pouca-vergonha dos que acham que sempre foi assim e que temos de ser optimistas. Temos de defender — ou pelo menos não atacar — os nossos "pimbas", porque são nossos. Temos que ampliar aeroportos e fazer mais aviões porque é o progresso. E depois temos os profissionais do optimismo: os adeptos da "psicologia" coach e da auto-ajuda. Nas piores alturas, surgem sempre estes apologistas da desgraça engraçada (para eles). É vê-los a facturar formações de encher carteiras (as suas) em apelos de puxar para cima o que temos de melhor, que provavelmente é a crescente vontade de os mandar à merda.
Salvam-nos a arte, a cultura, a ciência, que não se integram em nada disto. Pelo contrário: fornecem-nos ferramentas para o combate. Os vibrantes sons, as mais inquietas obras visuais, as mais irrequietas letras, os mais desejáveis progressos científicos continuam a esclarecer-nos, a alegrar-nos e a emocionar-nos com surpresa, com originalidade.
É disso que precisamos para continuarmos o combate contra a insistente estupidez e subordinação. Bom futuro para todos, apesar de tudo isto.