Álvaro Cunhal lutou toda a vida pela liberdade e pela democracia. Toda a vida. Tendo todas as qualidades para ser o que quisesse, o dirigente comunista trocou a comodidade pela luta contra os que tolhiam a comodidade aos outros. O país vivia em ditadura. A PIDE torturava e matava. A alegria e a vontade de conhecer o mundo eram proibidos. A felicidade era impossível. Ou pelo menos impossível à maioria. Os fascistas faziam o que queriam. O liberalismo social era possível. A agressão sexual por parte dos poderosos era elogiada. Patrões barrigudos e sebosos abusavam sexualmente de raparigas vulneráveis que para eles trabalhavam. Acontecia em fábricas de têxteis no norte e de conservas no sul. As mulheres são sempre quem deve sofrer correcções e as agressões são bíblicas. Lembram-se de Neto Moura? Álvaro Cunhal estudou direito. A sua tese final abordou e esclareceu a interrupção voluntária da gravidez como recurso último a praticar pelas mulheres sem condições de dignidade mínimas. Respeitava a qualidade de vida do ser humano como prioridade. Ouvi-o dizer isso em entrevista. Odete Santos e outras deputadas de esquerda lutaram no parlamento pela dignidade das mulheres. A ala esquerda do parlamento é quem mais faz pela dignidade das pessoas. Álvaro Cunhal sempre respeitou direitos e bateu-se por eles. Com atitude. Com o corpo. As suas motivações levaram-no para a prisão por uns violentos onze anos seguidos, oito dos quais em isolamento total. Imagina-se tamanho sofrimento?
Em tempo em que a Assembleia da República tem fascistas a pedir regressões, e em que esses deputados fascistas já mencionam o seu nome em tom insultuoso, e quando criminosos da PIDE dão entrevistas ao jornal manhoso da manhã, esclarecendo que os choques eléctricos são como cócegas divertidas aplicadas nos presos políticos, é preciso recordar Cunhal como grande defensor da liberdade, da democracia e da luta pela dignidade do ser humano. Ele lutou com coragem. A cobardia fascista tentou eliminá-lo. Em vão.
Fotografia de Eduardo Gageiro