sábado, 22 de junho de 2024

Os "justos" contra os "impuros"

José Pacheco Pereira hoje no
Público. Passo para aqui uma pequeníssima parte do assertivo texto. Mas diz tanto sobre esta choldra que nos julga e condena:

«Depois do 25 de Abril de 1974 muita gente escapou à justiça pelo seu comportamento durante a ditadura ou, mais ainda, pelo seu papel de participantes naquilo que era a essência da ditadura: a força bruta contra os que se lhe opunham, com mortes, prisões, torturas. Há, no entanto, em especial, um grupo que escapou à penalização do seu papel na ditadura: os juízes dos Tribunais Plenários. Esses juízes eram serventuários da PIDE, exactamente serventuários, impediam qualquer simulacro de julgamento e de lei, mesmo as que habitualmente a ditadura não aplicava, ficavam furiosos quando os presos referiam as torturas por que tinham passado, ameaçavam os advogados, chegando a mandar prendê-los em pleno julgamento. Era gente que devia ter sido punida com rigor, mas escaparam por uma mistura de protecção corporativa e por serem “meritíssimos juízes”, ou seja, gente da alta, digníssimos juristas, cheios de pompa e circunstância, um exemplo de como ter diplomas, cursos, latim não impedem que se seja torcionário aplicado.
Digo isto porque justiça não havia de todo então e estamos agora a caminhar para institucionalizar não justiça, mas violação de direitos humanos, abusos de poder, interferência não-democrática na vida política. Exagero? Nem pensem. O episódio da divulgação de escutas e documentos em segredo de justiça na comunicação social teve um único objectivo: prejudicar a candidatura de António Costa à presidência do Conselho Europeu.
Quem escolhe os tempos, seja o Ministério Público que pede as diligências, sejam os juízes de instrução que as autorizam, sabe muito bem qual o impacto público na vida política que têm medidas como as buscas. E sabe ainda melhor que cometer o crime de violação do segredo de justiça, divulgar escutas sem conteúdo criminal e fotografias do processo, no caso desta semana, directamente apontadas a Costa e à sua “casa” governamental, alimenta alguns dos seus opositores europeus que estavam a usar como pretexto a sua “situação judicial” (que ninguém sabe qual é), e é pura política e da pior. É um ataque à democracia que não precisa de qualquer lei sobre o discurso de ódio, para ser isso mesmo, ódio. E não é preciso ir mais longe para perceber como funciona esse ódio, por parte de muita gente que está furiosa com a possibilidade de Costa vir a ter um lugar de relevo na Europa, e que compara as fugas com as revelações de Assange. Sim, ouvi isto mesmo na Rádio Observador, que destila ódio a Costa como quem respira. E objectivamente pede mais sangue telefónico.»