domingo, 7 de abril de 2024

Design de comunicação


Assim de repente toda a gente se tornou especialista em imagem, mas também aconteceu que especialistas em imagem se tornaram toda a gente.
Explico melhor. Era uma vez um governo de um pequeno país, que, percebendo que a comunicação visual era importante, e que muitos outros países já estavam a perceber isso, resolveu encomendar uma imagem que ilustrasse esse país de uma maneira mais contemporânea, mais sofisticada, mais adaptável aos novos meios de comunicação.
Depois de muitas consultas e percepções do que se anda por aí a fazer em imagem e comunicação, foi entregue a um dos mais competentes estúdios de design — é assim que se classifica a actividade profissional que faz essas coisas — uma interpretação visual mais consonante com a realidade em comunicação visual nos nossos dias. Tenho a certeza absoluta de que o estúdio que desenvolveu esse trabalho fez um apurado esclarecimento dessa realidade, atribuindo um complexo trabalho de investigação e aplicação em suportes, a uma competente equipa de profissionais. Isso percebe-se pelos desenvolvimentos apresentados. Tudo foi previsto. Todas as aplicações foram testadas. Foram feitas maquetas, estudos teóricos, testes práticos, Foi até desenhado um tipo de letra específico, por um dos melhores profissionais da disciplina.
O trabalho foi apresentado ao governo do país que o passou a aplicar nos suportes institucionais. O governo aplicou-o, com justificado orgulho, diga-se, já que todos os estrados do esclarecimento político passaram a ter outro ar. Um ambiente visualmente mais asseado e sofisticado passou a morar nos ecrãs televisivos e nas páginas dos jornais. O país parecia outro. Visualmente, pelo menos, mas na prática denota um comportamento também melhor, mais inteligente e de mais confiança.
Sol de pouca dura, diria o povo. Um estardalhaço provocado por extremados juízes pôs em causa o governo. O governo caiu e foram convocadas eleições. As eleições foram democraticamente um desastre. Adeptos de ajustes frustes quadriplicaram representação no parlamento, e os reais vencedores formaram um governo cagarola que se rende aos auspícios dos frustes ajustadores. A nova imagem desse país foi por água abaixo, e os cagarolas — os cagarolas são básicos e ignorantes — foram buscar uma bonecada parola que já tinham usado quando em tempos foram governo, piorando ainda mais aquilo, acrescentado informação visual ao que já por si era excessivamente medonho. Os parolos que entretanto tomaram posse como membros do governo parolo, mandaram o mais parolo dos ministros anunciar a medida. O ataque à dignidade dos designers e artistas visuais foi a primeira medida do governo dos parolos.
Claro que nem todos os que votaram nos parolos são parolos. Mas muitos são, e os ajustadores frustes — que são 50 imbecis que ocupam o lado extremo direito — ficaram radiantes. Mas muitos comentadores acharam todo este comportamento excessivo. Há excessos verbais à direita e à esquerda. Toda a gente acha que fala com propriedade do que observa. Há casos caricaturais. Um ex-líder do partido que formou governo e que ocupou funções de topo na Europa veio dizer que as quinas eram indispensáveis. Pasma-se. O homem continua a confundir logótipo com bandeira. Não aprendeu nada na Europa. O líder do tal partido fascista que agora tem 50 deputados no parlamento chegou a dizer que usa as quinas nas cuecas. Um imbecil não tem noção de que é imbecil, mas confundir o aconchego das partes baixas com patriotismo é todo um programa de governo para ele, o imbecil.
Mas à esquerda também foram acrescentadas razões que desmentem a razão. Designers insultaram este trabalho como coisa simples em excesso, vulgarizando assim uma ideia que já inundava as redes ditas sociais. Muitos até usaram a clássica expressão: isto também eu fazia. Outros, mais idiotas, acrescentaram a sua expressão de bondade: eu, por esse preço faria melhor. O custo, que em qualquer dos outros países onde a imagem foi melhorada foi muitíssimo superior, foi outro atropelo à aceitação da coisa.
Mas também os desenvolvimentos a partir da ideia do trabalho original, vulgarizando a execução, transmitindo a ideia de facilidade técnica, não me parece uma boa reacção. Não se trata de plágio desavergonhado. A origem é assumida e a ideia está bem trabalhada, mas é pouco correcto para com o trabalho original que não é feito assim com três pancadas. Essa aplicação foi feita e foi muito partilhada, como boa ideia de esquerda contra a direita serôdia. Não me parece nada uma boa ideia, apesar de ter a sua graça. Acontece que o tempo não está para graças.
Esclarecimento final: penso que já perceberam de que país falo. É esse mesmo, o país Portugal. E acrescento que não espero nada de um governo que revela um tão elevado grau de cagarolice para com a extrema-direita incivilizada e ridícula.
No próximo dia 25 de Abril vamos para a Avenida da Liberdade dizer-lhes que não fazem cá falta nenhuma.
Termino com frases de uma canção do meu amigo Sérgio Godinho:
Ai, Portugal
dar-te conselhos é bem pouco original
(mas) se realmente não quiseres querer-te mal
olha p´ra ti, ó Portugal
e não te deixes assim vestir