terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Contra a invisibilidade


Desde que leio jornais que oiço falar em crise nos jornais. Leio jornais desde os primeiros anos em que aprendi a ler. Claro que a minha preferência aconchegava-se nas páginas ditas para a miudagem. O meu pai era devorador de jornais. Sempre entraram dois títulos por dia lá em casa. Cresci assim, sempre rodeado de papelada impressa. Tornou-se uma necessidade até hoje, e espero que me acompanhe até ao fim dos meus dias.

Os bons jornalistas denunciam. Os bons jornalistas procuram, analisam, escrevem e transmitem o conhecimento que adquirem. Fazem muita falta. Faz-nos bem ter acesso à denúncia.

Em tempos em que fascistas se reúnem legalmente e já defendem o indefensável, é bom que os jornalistas denunciem as barbaridades sugeridas pelos fascistas e pelos que acham que tudo é relativo e que os fascistas também são gente. Os fascistas não são gente. São grunhos falantes. São repugnantes.

Em tempos em que as negociatas banqueiras são chocantes e nocivas para todos, é bom que os jornalistas investiguem e nos informem a nós e a quem governa. Banqueiros corruptos devem estar na prisão e não nas poltronas das suas faustosas instalações profissionais.

Em tempos em que as polícias das cidades e dos campos só pensam em humilhar e insultar cidadãos estrangeiros e cidadãos portugueses que defendem o convívio entre pessoas diferentes, é bom que os jornalistas nos informem das atrocidades praticadas pelos chamados "agentes da autoridade" sobre os cidadãos.

Em tempos em que políticos misturam tudo: poder com negócios e actuam como se isso fosse possível em República e em democracia, é bom que os jornais investiguem e denunciem essas trapalhadas. 

Em tempos em que a procuradoria justiceira de um país quer moldar políticas e actua como vulgar delinquente de extrema-direita, é bom quando percebemos isso pela investigação jornalística.

Em tempos em que os artistas das rotundas e de outros ornamentos decorativos saem descaradamente em defesa das técnicas do plágio para assim resolverem a sua conta bancária sem grande esforço, e envergonham e enganam poderes institucionais e incautos apreciadores com a sua retórica balofa e triste em defesa do indefensável contra o óbvio, seria bom que jornalistas honestos investigassem os porquês de tanta arrogância da ignorância.

Em tempos em que escritores de prateleira de supermercado vendem lixo como literatura e enganam com técnicas "literárias" de auto-ajuda os incautos leitores de toda a trampa, é bom quando jornalistas experimentados mostram o que é literatura a sério.

Em tempos em que o panorama musical é inundado por gente abjecta que canta e declama "literatura de cordel" e apela à misoginia e à violação, ou ao amor de estalo e safanão, é bom quando os jornalistas nos revelam a boa música que existe e se faz no mundo. 

E quando, em tempos de busca da perfeição tecnológica, dirigentes mundiais de extrema-direita  declaram guerras para conquista de territórios, usando a tecnologia para matar, como se ainda vivêssemos nas trevas, são os jornalistas que nos informam, pondo em risco a sua própria vida.

Falo dos jornalistas sérios e competentes. Não incluo aqui os jornalistas a mando dos patrões dos grandes grupos que só pensam em lixar isto tudo. E a nós e a eles também.

Jornalistas devemos ser todos. Por necessidade de nos informarmos e por solidariedade com quem sabe informar. Mas jornalistas mesmo são estes que agora estão a sofrer a pressão dos que pretendem ser os donos disto tudo.

Precisamos de vocês. Solidariedade.

Imagem: Pistola instalada em frente à sede das Nações Unidas, em Nova Iorque. Foi concebida após o assassinato de John Lennon. Escultor: Carl Fredrik Reuutersward. Fotografia: ONU/Manuel Elias.

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