Language is a Virus
Laurie Anderson
Ana Nogueira vagueava pela floresta quando ouviu um violino que soltava um som vi- brante e arrastado. Moveu-se no sentido desse som. Suspendeu os movimentos do corpo e a respiração. Tentou perceber a origem daquele ambiente único. Perdeu-se por entre arbustos e rochedos. Deambulou por entre folhas amareladas, secas. Arriscou o vaguear até que a luz do luar abraçou a floresta.
Desenhou então movimentos com o corpo, numa dança em que o próprio corpo se envolveu com aqueles troncos secos, ramos delgados e arbustos frondosos. Riscou linhas no papel, raspou a superfície. Surgiram manchas que lhe transmitiram a satisfação eo desejo de procurar mais. Linhas e manchas que desenharam ambientes imaginados. Por isso não parou. Insistiu. Investiu com rigor de cientista sem ciência, num registo de procura sem preocupações de funcionamento ou solução. Pesquisa intensa, mas nunca esclarecida por soluções académicas ou decisões de finalização. Este trabalho não está finalizado. Nunca estará.
Os desenhos que observamos sugerem a presença da artista. O corpo envolve-se na paisagem. Densas florestas parecem querer romper o papel numa violência soprada por um vento ora suave, ora agressivo e cortante. As dimensões destes trabalhos sugerem o nosso envolvimento. Parece haver um convite a uma aproximação fisica a este papel tão vibrantemente riscado. A intensidade do gesto é denunciada por essa vibração. Tentamos um discurso sólido que enuncie as pretensões da artista. Uma linguagem que traduza atitudes e procuras. Mas a linguagem é muitas vezes um vírus perigoso. Deambulando perdemo-nos, mas não ficamos entediados porque somos surpreendidos pelo desconhe- cido. Por uma inesperada angústia que nos inunda e fascina os sentidos. Pretendemos a surpresa. Percebemos então os trilhos de uma certa felicidade, mas continuamos incon- formados numa permanente procura do desejo. Uma virose que não mata, antes alastra perpectuando essa vontade. Uma dor que se transforma em prazer, alheia a percursos tortuosos ou pouco exigentes. Situamo-nos no território da exigência. Na vertigem de encontrarmos outras vontades de fazer. Sempre. É esta a linguagem visual desta floresta, na minha linguagem. Bem vindos à floresta de Ana Nogueira. José Teófilo Duarte