domingo, 19 de abril de 2020

Celebrar a coragem

O 25 de Abril comemora-se sempre. Foi a partir desta data que nos foi permitido viver em liberdade. Logo, esta comemoração faz-se todos os dias, quando um homem quiser. 

Mas não é como o Natal. O Natal não se celebra no parlamento. Assim como a Páscoa, ao contrário do que pensa o deputado do CDS/PP João Almeida, que se viu muito incomodado por a Páscoa não ter sido comemorada e o 25 de Abril sim. Quem lhe terá posto na cabeça que as coisas funcionam assim? E logo a ele, que é deputado. Um tonto ridículo, mas deputado. O seu líder veio igualmente manifestar-se contra festejos no parlamento. E, claro, o deputado fascista da Cofina também: o alarve não perde uma oportunidade para desrespeitar o sistema, como ele diz. Enfim, tenta baralhar-se tudo, como de costume. Confunde-se confinamento da população com ritualização parlamentar. Os deputados não estão a trabalhar? Com regras, facto, mas vão lá e é assim que tem de ser. O sistema democrático não se suspende. Nunca. Os eleitos podem perfeitamente representar-nos no parlamento neste ritual de celebração da democracia. Democracia que permitiu aos Almeidas, Chicões e Venturas da triste vida manifestarem-se contra tudo o que faz lembrar Abril.
Dito isto: acontece que nunca assisti a comemorações institucionais pela televisão, e nunca fui à Assembleia da República celebrar coisa nenhuma. Comemoro o 25 de Abril todos os dias — praticando a liberdade que me foi conferida a partir dessa data — e, no dia propriamente dito, na rua. Gosto de estar com a minha gente contra essa gentinha que prefere sempre celebrações de fantasias. Na casa onde se exerce a democracia a um nível institucional, a coerência de se manter viva uma data que permitiu esta existência é saudável para o sistema.
O meu 25 de Abril este ano vai ser em casa, mas não vou estar sozinho. Vamos estar uns com os outros. Vamos recordar e celebrar um dia que nos mudou a vida. Para melhor. Para uma vida decente vivida sem refúgios perante a ameaça fascista. A frase de José Afonso que apliquei neste cartaz define a acção dos que lutaram — alguns morreram — pela defesa da liberdade. Bocage também defendeu a "Liberdade querida e suspirada que o despotismo acérrimo condena". Estou com Zeca e Bocage. Prefiro os melhores.

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