quinta-feira, 20 de abril de 2006

Mil Folhas | DDLX



A exposição abre hoje. Jorge Silva escreveu este texto para o catálogo:

O André Letria foi um dos ilustradores de referência do primeiro ano do Mil Folhas, suplemento de literatura e artes plásticas do jornal Público. A primeira capa, a da edição de 11 de Novembro de 2000, é dele. Naquele corpo sangrento, de coração vazado, exposto num fundo negro, ficou registada a matriz visual que guiou a ilustração das capas do suplemento durante os seus primeiros tempos: ilustração metafórica, técnicas de representação densas, depuração gráfica e cromática. Aqui se mostram nove dessas capas cuja homogeneidade gráfica e concentração temporal formam uma unidade distinta dentro da vasta e multifacetada obra do ilustrador.
Que revelam estas ilustrações? Sonhos de infância, brinquedos e miniaturas de objectos reais que o André tem guardados numa caixa inesgotável. E que convoca, monta, desmonta e recompõe em associações poéticas e bizarras. Surrealistas, portanto. E realistas também. De um realismo fantástico, tão caro à ilustração do Leste europeu, nas suas metáforas angustiantes e síntese gráfica. E tão André Letria pela sua genuína doçura, a figuração simples, sem a crueldade que muitas imagens fariam prever, a que a pintura em acrílico confere profundidades a pedir um segundo olhar. Acresce a mestria gráfica na composição e na percepção exacta do lugar da ilustração na soma final de imagem e texto que é a obra impressa.
Para sempre guardarei a capa de Sade como um momento mais que perfeito de todos os momentos perfeitos que aqui se mostram. A torre/prisão de Sade, sozinha em palco, vulnerável, o seu torreão/glande e a sua subtil e fálica curvatura, os vermelhos saturados da cor do sexo e da clausura opressiva. Pura beleza.
Jorge Silva

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