quarta-feira, 13 de abril de 2005

Paulo Leminski



moinhos de versos
movido a vento
em noites de boemia

vai vir o dia
quando tudo que eu diga
seja poesia
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lembrem de mim
como de um
que ouvia a chuva
como quem assiste missa
como quem hesita, mestiça,
entre a pressa e a preguiça
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isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além
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acordei bemol.
tudo estava sustenido
sol fazia
só não fazia sentido

Estes pequenos grandes poemas são de Paulo Leminski, poeta relativamente pouco conhecido do grande público, mas adorado por aqueles que conhecem sua obra. Leminski era natural de Curitiba, capital do Estado do Paraná, onde nasceu, em 1944, e onde veio a falecer, em 1989. Começou a publicar poemas na revista "Invenção", porta-voz da poesia concreta paulista, em meados dos anos 60. Também compositor, teve canções suas gravadas por Caetano Veloso por conjuntos como o "A Cor do Som". Além de escrever prosa e poesia, traduziu obras de James Joyce, Samuel Becktett, Alfred Jarry, entre outros, colaborando, também, com o jornal "Folha de São Paulo" e com a revista "Veja". Em 1975, publicou o romance experimental "Catatau", celebrado pelos críticos literários como um livro "divisor de águas", ao apresentar renovações no terreno da linguística na senda aberta por Pound, Joyce, Beckett e Guimarães Rosa. (No final dos anos 80, sua biografia sobre Trotski foi livro de cabeceira daqueles "que amávamos tanto a Revolução", mas que nutríamos uma admiração secreta pelos dissidentes...) Sua obra, sobretudo a poesia, exerceu influência marcante nos movimentos poéticos dos últimos 20 anos. Não cabendo apenas no rótulo de poesia concreta, a poética leminskiana funda-se sobretudo na ideia de engenharia de linguagem, na qual sua verve crítica e ao mesmo tempo bem-humorada varre um sem-número de aspectos (ou seriam espectros?), que vão da política à metalinguagem, passando pela literatura e pela própria dimensão existencial. É um autor que merece ser (re)descoberto e certamente a reedição de suas obras contribuiria para tal. Em 2001, um de seus poemas ("Sintonia para pressa e presságio") foi selecionado por Ítalo Moriconi para ser incluído no livro "Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século", da Editora Objetiva, do Rio de Janeiro.
ALF