quinta-feira, 18 de março de 2004

Mano preto/mano branco

Os meus amigos Jaime Pinho e Alberto Lopes, professores na Escola Secundária D. João II, em Setúbal, lançaram-me o desafio: Editar o trabalho dos alunos do 9º ano da escola sobre o problema colonial. Desafio aceite. Os testemunhos recolhidos pelos estudantes são de uma impressionante qualidade humana. O racismo e o colonialismo tratados como nunca o foram até hoje. Relatos reais e emocionantes. O livro, com o titulo "Mano preto/mano branco", será colocado nas livrarias a partir de segunda-feira.
O extraordinário escritor angolano Pepetela, é o autor do sentido prefácio.
É esse texto que aqui partilho convosco.

"Este trabalho que professores e alunos do 9º ano da Escola Secundária D. João II nos apresentam é comovente por mais que uma razão. Por um lado, pelo labor de recolher testemunhos de vidas que não puderam viver, os jovens são levados a reflectir sobre experiências alheias e neste caso vivências em países muito afastados pela geografia senão pela emoção. E também fazem as pessoas recordar os seus passados, hoje com certo distanciamento psicológico, mas certamente ainda com muito sentimento. Adivinha-se facilmente uma lágrima num canto de olho em cada resposta dada.

Para a juventude portuguesa, o passado ainda recente de Portugal (e particularmente o seu passado colonial) deve ser qualquer coisa que se entende quando se estuda, mas pouco se sente, porque pouco falado em casa, quase envergonhadamente escondido. São trabalhos como este que fazem as pessoas entrarem na pele do outro e sentirem com ele as amarguras e o sofrimento que regimes sociais injustos possam ter produzido em povos com os quais conviveram. Conhecer as injustiças da situação colonial, reconhecer que os nossos antepassados talvez afinal não tenham sido tão heróicos como muitos se esforçaram por nos fazer crer e que terão mesmo que inconscientemente contribuído para o sofrimento dos outros, isso não nos diminui, nem sequer diminui os nossos antepassados. Reconhecer as nossas fraquezas significa ter uma grande força de carácter e capacidade de mudança.
Para que as pessoas tenham um relacionamento mais sadio e mais puro, é necessário que se saiba exactamente aquilo que as afastou a um momento dado. Então, as diferenças entre as pessoas podem ser compreendidas, aceites como um bem inestimável e servir para um enriquecimento mútuo. É o que pode e deve passar-se com os povos de Portugal e de Angola e de Moçambique, para só referirmos os que estão relacionados neste estudo. Poderíamos alargar a ideia para todos os povos do mundo.

Pessoalmente, gostaria de agradecer ao colectivo desta escola por me terem dado a conhecer este trabalho tão belo e me honrarem pedindo-me estas modestas linhas."

Titulo: Mano preto/mano branco
Autores: alunos do 9º ano da Escola Secundária D. João II. Setúbal
Capa: Ilustração de Eurico Coelho
Design/paginação: José Teófilo Duarte | Eva Monteiro [DDLX]
Edição: Estuário Publicações

JTD