As sondagens valem o que valem, diz-se sempre. Pois valem o que valem. Mas cada vez devem valer menos. Percebemos que as sondagens fornecem-nos as vontades dos seus fazedores. Era preciso colocar os santos da direita nos altares do poder. Era preciso derrubar o governo eleito. Chamem os poderosos procuradores. Chamem as polícias. E agora chamem os arautos da desgraça. Vamos alardear a injúria. Vamos espalhar a mentira. Chamem o Ventura. Chamem os saltibancos do Chega. Vamos adivinhar o futuro. Tragam a bola de cristal das sondagens. Perguntem lá o que pensa aquela velhota. E agora perguntem ao puto da geração mais bem preparada de sempre. Ele vota nos neofascistas? Botem no gráfico. A velhota vota no Cavaco? Eh, pá, não é no Cavaco, ponham aí Passos Coelho. Também não? Ah, pois, tá bem, é naquele novo do PPD, como é que ele se chama? É o coiso, pronto.
Pronto, já foi. Tinham razão: os putos votaram nos fachos. Mas os velhos não. Olha, afinal o coiso do PPD não teve tantos votos como nós esperávamos. Afinal, mesmo com alianças forçadas com os do ex-CDS e com o marialva lélé da cuca, o coiso do PPD e mais eles todos juntos só ficaram com mais dois deputados. Agora vão formar governo. Vai ser lindo de se ver e sentir. O fascista xenófobo e racista já começou a bater na ideia da igualdade de género. Os trabalhadores da cultura já estão em risco. Essa merda serve para alguma coisa? Os pobres que neles votaram já têm prometido um futuro ainda mais incerto. Querem saúde? Querem aumentos? Aprendam a safar-se. Aguentem-se. Mas o povo quer mudança. Quer dar o salto para a outra margem depois de derrubarem a ponte. Vai ser um salto do caraças.
Agora a sério... Os debates posteriores aos resultados trouxeram aos monitores televisivos os fala-barato do costume, mas também algumas pessoas que ornamentam o verbo com decência. O inenarrável José Manuel Fernandes, do site ultra-conservador Observador, destila ódio quando fala do PCP. Não vamos aqui recordar o passado deste comentador da direita mais à direita. Mas o que ele diz de um partido que ele combateu, pelo lado da esquerda mais radical que havia, é de bradar ao céu dos pardais, que é a barriga dos gatos. Diz que o PCP (partido que lutou contra o fascismo, digo eu), queria uma ditadura em 1974. E que o Chega quer uma democracia. Fantástico, não é?! Não esclareceu em que moldes, mas lá foi vomitando aquele ódio que de tão intensamente expresso, mais parece opereta de cordel. Carmo Afonso esclareceu-o e rebateu as enormidades que o homem brota daquela bocarra: o PCP não só é um partido da democracia, que fez parte da sua construção, como é fundamental à democracia actualmente. José Manuel Fernandes é um dos fundadores de um jornal que tenta mirrar o espaço da esquerda em Portugal. Claro que sabe o que aconteceu em 1974, ele estava lá, do lado dos que queriam de facto uma ditadura, mas agora parece que quer fazer esquecer tudo e ser o santo padroeiro dos betinhos direitolas. Percebe-se. A incoerência nunca pode ser coerente, excepto quando é Ventura a praticar a modalidade. Vamos assistir a uma definitiva normalização do Chega. O que fazer agora, que a tropa fandanga se prepara para dançar a dança sinistra do neoliberalismo e do justicialismo pantomineiro? É lutar contra eles. Sempre!