domingo, 13 de setembro de 2020

Elogio do Editor

Morreu no passado dia três o editor Francisco Espadinha. Convivi com ele nos tempos em que ele dirigia a Presença e eu tratava da LER graficamente. Era um homem de excelente trato e um editor com elevadíssimo conhecimento do seu ofício. 

Nesse tempo conheci outros dois seus colegas que ficaram meus amigos até hoje: Carlos Araújo e Nelson de Matos. São os três divulgadores de livros que marcaram a minha passagem por esse fascinante território da Edição Literária. A morte de Francisco Espadinha foi assinalada pelos seus pares e por um público mais atento, mas o que lhe devemos não cabe em elogios de circunstância. Devemos-lhe o acesso a autores que nos mudaram a vida. A sua competência e cultura inscreveram a edição em Portugal nos patamares mais avançados da edição literária. Tenho por ele um respeito e admiração que tive o gosto de lhe demonstrar pessoalmente no almoço comemorativo do aniversário da Culsete a que a Fátima Medeiros faz referência no texto abaixo publicado. Texto que ela enviou por correio electrónico, para os amigos, no dia da morte do editor.

Um adeus para o Francisco Espadinha
Tem sido duro ver partir nestes últimos meses tanta gente importante para o livro, para a cultura, para a democracia. Tanta gente importante para mim.
O que o Dr. Espadinha nos deu a ler desde os anos de 1960 contribuiu em muito para o que somos hoje. A poesia, a ficção, o ensaísmo de aprofundamento das ciências sociais e humanas, os livros de arte e os dicionários temáticos, a literatura de receção infantil e até os livros mais práticos fizeram-nos crescer de muitas maneiras. 
Para além de livros e autores mais óbvios de que nos fala o comunicado institucional da Presença, olho em volta e encontro a Teresa Rita de Afetos ou Cicatriz, o Daniel Filipe da Invenção do Amor, a Irene Lisboa de Uma Mão Cheia de Nada ou de Solidão, o J.P. Sartre de Os Dados Estão Lançados ou de As Moscas, o Plekhanov das Reflexões sobre a História, o meu primeiro Alberto Manguel, Uma História da Leitura, o Ler para Ser, do Moniz e do Olegário, que mais do que um manual me habituei a consultar e partilhar como coletânea de textos. É mesmo de agradecer por tanta coisa boa.
Francisco Espadinha foi também uma destacada figura do associativismo editorial e livreiro através da APEL. Essas funções permitiram aprofundar os seus contactos com Manuel Medeiros, tendo contado sempre com o apoio do livreiro.
Ao longo dos anos, o editor esteve várias vezes no espaço da Culsete, em atividades de promoção dos seus livros. Esteve também em vários lançamentos de livros editados pela sua editora em espaços públicos e institucionais em Azeitão e Setúbal, em seções organizadas pela Culsete.
Em 7 de Julho de 2013, no almoço de comemoração dos 40 anos da nossa livraria lá esteve o Dr. Francisco Espadinha, manifestando publicamente o seu apoio. Foi a última vez em que estivemos juntos.
Depois a vertigem dos dias tomou conta das nossas vidas e não voltámos a conversar. Mas íamos sabendo um do outro.
Para memória futura ficam cartões e cartas, mensagens por e-mail, algumas fotos. 
Fica sobretudo aquilo que guardo em mim. 
E a certeza de que “a morte é a curva da estrada”. 
Obrigada, Francisco Espadinha, por ter contribuído de forma tão afirmativa para o crescimento dos níveis de leitura deste país e por ter ajudado a construir um pensamento crítico e atuante.
Daqui, deste lado da estrada, um abraço bem apertado para todas e todos com quem partilho a dor desta partida. [Fátima Ribeiro de Medeiros]

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