segunda-feira, 16 de setembro de 2013

PÚBLICAS VIRTUDES | As medidas terroristas, perpetradas pelo governo da nação contra os funcionários públicos, têm apoio em bastos sectores da população. Institui-se a ideia de que o funcionário pago pelo Estado é o grande mal despesista. Não passa pela cabeça de ministros, secretários de Estado ou outros prestadores de superiores serviços estatais que as pessoas que estão a atacar trabalham e muitas vezes muito. Estou à vontade para atirar esta pedra: não sou funcionário público, mas trabalhei durante um período da minha vida com funcionários de vários organismos públicos e vi gente esforçada que se esfalfava a trabalhar. Há madraços? Claro, mas alguém conhece uma lei que corrija a preguiça e a irresponsabilidade? Esses males devem ser percebidos no local próprio. Haverá lugares com funcionários a mais e outros com falta deles. A correcção deste problema chama-se organização do trabalho. É organizando o trabalho que se percebe a sua eficiência ou não. Toda a gente percebe que isso tem de ser feito.

Os cortes nos vencimentos de quem trabalha são crime. Os cortes nas pensões, de quem confiou ao Estado parte dos seus rendimentos na vida activa, para poder estar descansado quando a vida já  vai longa, são crime. São crimes civilizacionais. Estas "regalias" deram muito trabalho. Para justificar a delinquência, o governo faz passar a ideia de que os criminosos são os funcionários. É uma táctica antiga de quem governa: pôr quem trabalha contra quem trabalha. Mas os carrascos da governação têm ao seu serviço os opinadores defensores do respeitinho antigo. O abominável João César das Neves já faz, sem pingo de vergonha, o elogio da vida dos portugueses no tempo de Salazar. A desfaçatez deste ser execrável leva-o a apontar a compra de frigoríficos e outros utensílios de apoio doméstico, como excessos de consumo que nos colocaram no estado em que nos encontramos. Para este cristão ainda devíamos cozinhar em fogões a petróleo. Ou mesmo a lenha, porque não?! E devíamos circular em carrocinhas puxadas por animais. Provavelmente é o meio de transporte que o asqueroso justiceiro financeiro utiliza.

Estamos cercados por esta gente: governantes, opinadores e uma certa populaça sem trambelho que acredita não haver outro caminho. O neoliberalismo vai partir o Estado Social e fazer regressar a sociedade ao tempo em que as pessoas pediam desculpa por ter fome. Os funcionários públicos são atirados para as ruas da amargura por quem os devia defender. Basta ouvirmos a inenarrável criatura que nos calhou por azar em primeiro-ministro. Mas esta guerra é contra todos. A procissão ainda vai no adro. Os pios defensores do caminho único transportam o pálio de todas as certezas. O desfile vai ser longo. A dignidade das pessoas não conta. As leis não são para cumprir. Há que corrigir, cortar, anular, para que os donos do mundo se sintam em casa. O mundo é a casa deles. Nós ficamos à porta.
Imagem: João Abel Manta. Caricaturas Portuguesas dos anos de Salazar.
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