sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

A blusa de Matisse


Que outro vazio se esconde por detrás desta desmedida ambição de fazer História através da pequena história de acidentes e casualidades que é o destino de cada um? Apesar disso, foi um deles que disse ser a História uma "confusão cruel e imbecil", tal como o génio, disse outro, é "uma aposta estúpida". É curiosa a surdez desta espécie aos sinais que os sábios lhes enviam intermitentemente: se os ouvissem, se lhes prestassem atenção, que é uma coisa que muito custa aos humanos porque andam a ouvir-se falar, como crianças que acabassem de descobrir que o barulho que produzem com a voz suscita o deslumbramento dos outros, se prestassem atenção, dizia eu, compreenderiam como a vaidade da História e a ilusão do génio andam de mãos dadas nesta aventura demencial e impossível que é a sua ambição de glória e posteridade. A blusa romena António Mega Ferreira

A história passa-se em Lisboa, mas convoca gente de outras geografias. Ceausescu e o seu fastidioso regime são alumiados. Há um escritor competente, um «caixeiro-viajante de almas» - seja lá isso o que for -, uma rapariga que dança à volta de um varão, e muito mais gente que circula nos ambientes em que todos circulamos quando preferimos Lisboa para circular. O quadro de Matisse que empresta o título ao livro é o motivo de todos os enleios.
Um bom romance que anuncia novas ideias do seu autor. Lê-se com prazer e fornece boa disposição. Gostei muito.

Título: A blusa romena
Autor: António Mega Ferreira
Design: Atelier de Henrique Cayatte com Susana Cruz
245 páginas
Editor: Sextante editora