sexta-feira, 9 de junho de 2006

Os resistentes


Foi na FNAC-Chiado, ontem ao principio da noite.
Debatia-se um trabalho em dvd, da responsabilidade de Joaquim Vieira, sobre a vida de Álvaro Cunhal. Chamados a opinar: José Pacheco Pereira, Odete Santos e João Madeira. Joaquim Vieira moderou. Começou-se pelo fim. O funeral e os motivos de tanta emoção. Pacheco Pereira, senhor de vasta informação sobre a matéria, falou-nos do dirigente político com as características daquele tempo que soube gerir uma ímpar actividade de resistente. Não definiu os contornos do carisma motivador da impressionante manifestação de pesar.
Odete Santos falou do seu conhecimento da participação de Cunhal na vida colectiva do partido. Intervenção mais apaixonada, mas sem excessos.
João Madeira, investigador da história do PCP, deu a sua visão desse terreno. Chamou o rigor. Foi rigoroso.
Já mais para o final foi convidado a intervir Jaime Serra. Membro do PCP desde os tempos difíceis e camarada muito próximo de Cunhal. Visão apaixonadíssima e amarga. Compreende-se. Os tempos são outros. Serra lamentou o sub-título do dvd - Um resistente - por acha-lo redutor. Os comunistas foram resistentes porque era o que podiam ser naquele tempo. Mas o que de facto queriam era mudar a sociedade. Disse o velho dirigente. Claro que podemos dizer que resistir já contribui para essa tentativa. Mas adiante. Resolvi intervir pegando nesta opinião. É a actividade de resistente anti-fascista a marca mais simpática de Álvaro Cunhal e dos comunistas. Considero até que é por aí que vem o tal carisma. É a coragem resistente que revela o lado mais humano. Se calhar, as acções clandestinas, sempre associadas ao mistério que sugerem, provocam um fascínio que fazem a transição para o carisma. O mistério sempre andou por perto na vida do dirigente comunista. A obra literária era um mistério. Assim como misteriosa foi sempre a sua vida pessoal. Com toda a legitimidade, note-se, mas é um facto. Os desenvolvimentos conhecidos já na última etapa da sua vida é revelador. Pacheco Pereira concorda e avança com a sua opinião sobre a personalidade e a sua construção. Para ele existe uma construção desse mistério. Isso deve ser dito sem complexos. O PCP tem que deixar de tratar o seu líder histórico como um santo. Os santos não fazem história, vão directamente para os altares. Odete Santos discordou. Cunhal rejeitou sempre o culto da personalidade, logo nunca premeditaria nada que se relacionasse com a sua personagem. Errado. Pensar nele não lhe tira qualquer valor. Os excessos de humildade não fornecem grandes resultados. Cunhal pensou nele próprio. Conheceu museus, aprofundou conhecimentos artísticos, correu mundo. Que mal há nisso? Nenhum. É muito mais lamentável a falta de curiosidade intelectual por parte de políticos. Essa curiosidade nunca abandonou Álvaro Cunhal. Esteve com ele até ao fim. É também isso que o torna uma personagem fascinante.
JTD
Desenho de Álvaro Cunhal