segunda-feira, 10 de janeiro de 2005

Deus também tira férias?



O drama asiático já fez as mais variadas opiniões. Todas solidárias. Todas piedosas.
Mas acima de tudo fez vítimas. Morreu muita gente. Gente que não merecia esta tragédia. Ninguém merece que uma tragédia destas lhe caia em cima.
Uns acham que foi um castigo dos céus. Talvez as inacreditáveis testemunhas de Jeová vejam aqui o princípio do fim do mundo há tanto almejado.
Outros interpretam este fenómeno como um desastre natural com poucas possibilidades de prevenção.
Há quem fique chocado com o excesso de informação. Outros ficariam mais satisfeitos com campanhas de caridade mais intensas.
Há espectáculos de solidariedade. Há quem manifeste o seu pesar entre duas festas sociais, tipo "Tão bonzinho que eu sou".
Há de tudo um pouco. E para lá de tudo isto, há as pessoas que de um momento para o outro ficaram sem nada.
Num habitual debate semanal, na RTP 1, o inenarrável Pires de Lima, do PP, dizia que nós devíamos estar muito agradecidos por nada nos acontecer neste cantinho abençoado. E os que estiveram à mercê deste desastre, dirigem-se a que repartição de que teocrática instituição? Talvez o inefável Lima pudesse esclarecer as populações atingidas sobre os motivos do castigo. Noutro debate, "O Eixo do Mal", na SIC N, toda a gente se queixou do tal excesso de divulgação da intempérie. E, alargando o âmbito da discussão, da banalização em que essa repetição transforma as tragédias. Talvez tenham alguma razão. Mas chegar-se ao ponto de considerar as fotografias de Sebastião Salgado um vómito, parece~me excessivo. Sim, um tal Júdice, criatura que quase sempre diz nada, resolveu dizer algo demolidor. Ou seja, considerar a obra de um fotógrafo singular, algo de verdadeiramente repugnante.
Esta gente prefere esconder o sofrimento humano, porque esteticamente não é apreciável. Preferem a caridadezinha à solidariedade.
Da forma como prolifera, até parece que o disparate foi abençoado.
JTD
Fotografia Sebastião Salgado